Os MacGyvers do amor
O verbo a seguir ao amar devia ser cuidar.Cuidar é a prova de amor mais bonita que se pode prestar (quando o amor presta). Cuidar é isso mesmo, passar da paixão, aos actos. Se quiserem, é o grande teste. Como nos reality shows em que só continua em jogo quem tiver vencido o desafio, no amor só continua a dois quem continuar a cuidar - ou então há ali alguém que está a sofrer muito.Quando nos submetemos ao juramento do amor eterno devíamos selar um pacto! Não de amar para a eternidade, mas de cuidar - porque tenho concluído, quem resiste ao tempo e suas armadilhas, quem resiste a dois, é quem cuida.Cuidar - e por muito que não queira dar a palavra aos católicos (longe de mim dar razão a quem raramente é coerente nos actos com as palavras que repete cegamente) - é permanecer nas horas boas e más, na alegria e na tristeza. Direi até que sendo o cenário actual agreste, acredito que só os bons vão continuar juntos. Não aqueles que se encostam e acomodam. Cuidar é uma coisa que não se disfarça - os que cuidam não são os mesmos capazes de um embuste. Cuidar é de facto ter o coração grande, um coração que não encolhe quando o outro engorda, adoece, ou perde o fôlego.Parece-me que maior parte de nós, hoje em dia, salta da relação antes desta parte do cuidar. Nós vivemos o fogo da paixão (é inigualável), depois permitimo-nos ainda o amor - mas já aqui estranhamos. E depois, já confortados e confortáveis, começamos a desconfiar do que temos. Não só desconfiamos, como muitas vezes desdenhamos! E é nesta altura que saltamos para fora do nosso espaço, viciados que estamos hoje em dia em procurar o novo. Todos nos revemos nesta ideia e, no entanto, todos a rejeitamos.Tudo seria mais simples se, de cada vez que encontrássemos a pessoa certa (ou quase certa), as campainhas soassem ou um alarme luminoso se acendesse. Era bom que não houvesse forma de não percebermos que aquele era o amor das nossas vidas e que nunca (jamais!) o poderíamos deixar escapar, a não ser que quiséssemos. Já agora também era bom que ficasse claro que há pessoas que cultivam o sofrimento, o seu e o dos outros.Cuidar devia ser algo que aprendemos na escola. Como beber leitinho com chocolate da caneca. Como estudar a obra de Camões ou Saramago. Cuidar, amar, devia estar nos livros, a questão é, quem é que tem moral para ensinar o amor? (Se Saramago esperou tanto para conhecer o amor da sua vida?)Eu entristeço quando vejo amores descuidados. Gente que não deu o litro, nem um quarto (!) E no entanto se atira a uma espécie de sofrimento porque a pessoa que julgava amar o abandonou.Estas também são as pessoas que só percebem que amam na ausência. Depois, quando tudo lhes falta (e o tudo passa a ser o outro), armam-se em MacGyvers do amor. Vão, inventam, tentam, quase morrem para salvar o amor que já se perdeu. É tão engraçado! E depois estas pessoas, que nada cuidaram, podem ficar anos numa espécie de luto a chorar pela pessoa que os deixou. Durante o tempo em que o amor estava a ser vivido a dois, nunca fizeram nada para o salvar - salvaguardar. As pessoas não cuidam e depois não podem ser cuidadas. Depois fica um buraco enorme e elas enchem-no a qualquer preço, com saltos mortais, acrobacias várias (e perigosas) que provem ao outro que apesar de não terem estado lá nos últimos anos, agora estão, e agora é que é a sério. (Para o outro, normalmente, é tarde demais...)Cuidar é em vida e agora, no amor vivo e presente. Persigamos o que vivemos, não o que perdemos!Oh God, make me good, but not yet!
por Cidália Dias
costumo usar o nome Macgyver para descrever a minha geração "rasca" profissionalmente, mas depois deste texto acho que somos Macgyvers em tudo, até no amor...
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